Um escritor


Tenho em mim excessos em demasia, vontades homéricas tão avassaladoras, capazes de me revirar do avesso enquanto minha mente percorre todo o universo. E simultâneo a isso, uma necessidade inegociável de paz. 

Quero transcender em ideias, e moldar o barro onírico da criação em manifestações físicas e sensoriais, mesmo que a incapacidade material desse feito seja de meu conhecimento, o que me desdobra em milhares de versões atormentadas de mim, eternamente insatisfeitas, infinitamente ansiando pelo que poderia ter sido e pelo que ainda pode ser. 

Minha persona inconstante oscila entre a depressão e a euforia, domada por química arbitrária que me leva a lugares tão altos que me vejo desafiado a tentar voltar sem me cortar nas farpas do caminho sem sequer ter noção de como cheguei lá. 

Exijo dos outros o que não deveria exigir, tampouco de mim mesmo. Sou a força gravitacional que atrai todas as dores, pois sonho todas as noites, sobretudo acordado, com a grande obra, a próxima realização que não existe, apesar de eu saber como ela se parece, e até poder vê-la caminhando em minha direção, lenta, tão lentamente inalcançável, e mesmo que por milagre se aproximasse a ponto de tocá-la, de certo desapareceria como uma lembrança perdida de alguém que acabara de acordar. 

É preciso então, aceitar as pequenas pegadas atrás de nós, registros de nosso progresso, e entender que somos o que podemos ser aceitando que nem todos os sonhos se realizam, mas ainda assim - e eis aí a grande maravilha - quando nos damos conta já realizamos notáveis proezas, e parte daquele grande sonho, apenas a mínima parte que somos capazes de nos lembrar, 

ganha vida enfim, e caminha por entre nós nesta Terra. 

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